A autonomia da criança intersexual: crítica à teoria jurídica das incapacidades
DOI:
https://doi.org/10.18593/ejjl.v17i3.9548Resumo
Resumo: O tema da autonomia da criança perpassa a evolução histórica da sua condição enquanto sujeito de direito. Quando uma criança nasce com genitália ambígua, configura-se uma situação complexa que exige diversas iniciativas interdisciplinares. Com o presente artigo visa-se discutir a respeito da autonomia privada da criança intersexual diante da teoria da incapacidade jurídica. A autonomia privada da criança intersexual representa um direito humano, relevante e atual. Adotou-se uma abordagem de natureza qualitativa com revisão de literatura e revisão legislativa. Ao longo da revisão, constatou-se que a legislação, mecanismo de proteção desse segmento, está em contínua mudança. Quanto à produção científica sobre a intersexualidade, evidencia-se que as nominações da situação intersexual são diferentes, conforme o campo do saber e da prática. Constata-se, ainda, que a discussão sobre autonomia da criança intersexual não tem sido privilegiada. Reconhecendo-se o paradigma atual da proteção da criança, tem-se que o poder familiar, outrora irrestrito, passou a ser mitigado pelo princípio do melhor interesse da criança. Entende-se como medida mais adequada à proteção da criança que a cirurgia de definição do sexo, quando não for necessária à manutenção da vida, seja protelada, visando à percepção da criança enquanto parte do processo de definição do sexo de criação. Essa posição se fundamenta na dimensão participatória ou emancipatória que incide no debate sobre a capacidade de a criança exercer seus próprios direitos, segundo o conceito de autonomia progressiva. Palavras-chave: Direito da personalidade. Direito da criança. Intersexualidade. Autonomia.Downloads
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