CUMPRIMENTO DOS DESEJOS DO PACIENTE POR MEIO DAS DIRETIVAS ANTECIPADAS DE VONTADE

Autores

  • Eduardo Delatorre Kamijo Universidade do Oeste de Santa Catarina
  • Maria Victória Schweder de Lima Universidade do Oeste de Santa Catarina
  • Elcio Luiz Bonamigo

Resumo

As diretivas antecipadas de vontade (DAV) constituem um gênero de manifestação de vontade para tratamento médico, do qual são espécies o testamento vital e o mandato duradouro (DADALTO; TUPINAMBÁ; GRECO, 2013). O testamento surgiu nos Estados Unidos, após grande publicidade do “caso Cruzan”, para proteger o direito individual do paciente e garantir-lhe uma morte digna. Antes disso, já havia uma luta em favor da eutanásia – prática pela qual se abrevia a vida de um enfermo incurável de maneira controlada e assistida por um especialista. Neste trabalho, objetivou-se analisar a importância da universalização da aplicação das DAV no Brasil e sua regulamentação jurídica, com o intuito de ajudar médicos e familiares a cumprirem as vontades do doente quando ele estiver incapaz de decidir. O método utilizado foi a busca on-line por resoluções do Conselho Federal de Medicina e por artigos relacionados ao assunto, dos quais foram selecionados seis: Diretivas antecipadas de vontade: um modelo brasileiro; Terminalidade da vida e diretiva antecipada de vontade do paciente; Testamento vital: o que pensam profissionais de saúde?; Diretivas antecipadas de vontade: benefícios, obstáculos e limites; Testamento vital: percepção de pacientes oncológicos e acompanhantes; e Declaração prévia da vontade do paciente terminal: reflexão bioética. A partir da metade do século XX, a medicina sofreu avanços tecnológicos e diagnósticos na parte clínica, preventiva e cirúrgica. Em vista disso, a vida passou a ser o cerne das ações e das descobertas, com o intuito de adiar a morte, a qual passou a ser vista como uma inimiga a ser vencida a qualquer custo. Embora o prolongamento da vida seja benéfico, percebe-se como contraditório o fato de se manter uma vida que já apresenta sinais de morte, situação que leva o indivíduo, por vezes, a negar a presença da morte ou sentir-se fracassado diante dela. [CS1] Fica o dilema de quando se deve envolver todos os esforços possíveis em tratamentos para o prolongamento exagerado da vida[CS2]  – a distanásia – e quando se deve cessá-los para evitar um prolongamento além do natural – a ortotanásia. Entrementes, na composição da carreira médica e no seu longo tempo de formação, a manutenção da vida é o coração, a fim de que não se perca a essência da alma humana, por mais que a dignidade seja violada. À contramão disso, as DAV impõem ao profissional uma conduta sentimental, a qual coloca o médico na situação do paciente, isto é, de respeitar sua vontade mesmo que seja contrária à vida. Os limites para que o respeito à vontade do paciente de viver fosse preservado estiveram estagnados, levando à tona as questões legais e humanas sobre a dignidade da vida. Com isso, o Conselho Federal de Medicina (CFM), após dois anos de estudos, aprovou a inserção das diretivas antecipadas de vontade (DAV) – também conhecidas como Testamento Vital ou Living Will, em inglês – no âmbito da ética médica, em agosto de 2012. É um norte para o médico se aproximar do desejo do paciente em relação aos tratamentos e limites terapêuticos aos quais quer ser submetido. As DAV indicam os critérios que qualquer pessoa pode usar para estabelecer suas vontades, com seu médico, quanto às suas preferências, e ainda autorizar outra pessoa a decidir por si. A resolução define as [CS3] diretivas antecipadas de vontade como o conjunto de desejos expressos previamente pelo paciente a respeito de tratamentos e cuidados que quer ou não receber quando estiver incapaz de se expressar;nesses casos o médico considera suas diretivas antecipadas de vontade, e caso o paciente designe um responsável para tomar as decisões, o médico respeitará essas informações; elas serão registradas no prontuário do paciente e ele somente deixará de respeitá-las se estiverem em desacordo com o Código de Ética Médica.

 

Os principais efeitos positivos da DAV se relacionam com realizar o desejo do paciente por tratamentos menos invasivos, predominantemente paliativos no final de vida; facilitar as discussões de final de vida; ajudar no alcance de um consenso e fornecer clareza para outros membros da equipe multiprofissional e familiares com relação ao cuidado. (NUNES; ANJOS, 2014).

 

Com base na análise, é assegurada ao paciente a livre elaboração, modificação e revogação do documento a qualquer momento de sua vida. O instrumento visa garantir e proteger a autonomia do paciente, além de fazer com que ele pense a respeito de possíveis doenças e sua morte, para que converse com seu médico e familiares sobre sua visão a respeito dessas questões. O principal empasse na efetiva aplicação das diretivas está em uma cultura que nega a autorresponsabilização por sua própria condição de finitude acrescido de – em relação à quantidade de profissionais e de pacientes – um vago conhecimento de tal documento por essas pessoas.

 

Embora se trate de documento muito bem aceito entre os profissionais de saúde, o testamento vital encontra um grande entrave à sua aplicação: o fato de ser pouco conhecido pelos próprios profissionais. Os dados [...] atentam para a importância de ampliar a discussão do tema entre os profissionais de saúde [...] (CHEHUEN NETO, 2015).

 

Segundo Nunes e Anjos (2014), cada um idealiza sua forma de morrer, mas quando se está saudável não se consegue refletir sobre isso, e o assunto surgirá somente quando a morte estiver iminente. A morte precisa ser encarada de maneira mais construtiva, como uma fase inevitável. O objetivo do testamento vital, além de garantir que as vontades do paciente sejam cumpridas mesmo no fim de sua vida, é também ajudá-lo a refletir sobre o morrer e “[...] atribuir a esse fenômeno fúnebre um caráter mais humano.” (LINGERFELT et al., 2013). A literatura mostra, ainda, que a participação do paciente nas decisões sobre seu tratamento traduz melhores resultados, reforçando a importância da manifestação de seus desejos tanto para os profissionais da saúde responsáveis por seu cuidado quanto para seus familiares. É importante que o Brasil leve outros países como exemplo, principalmente a Itália, que movimentou positivamente a opinião pública, dos católicos e dos médicos, aplaudindo de pé a aprovação da lei que levou as DAV para o campo jurídico. Lá, o Código de Ética Médica segue exatamente as vontades antecipadas dos pacientes, e essa medida também foi aderida na Espanha alguns anos antes. Consoante estudo de Dadalto, Tupinambás e Greco, o aumento da expectativa de vida no Brasil e o fato de as patologias mais comuns nessa população serem multifacetadas e com perda de capacidades, enfatiza a necessidade de efetiva aplicação das DAV. Esse tema abrange não somente a garantia do direito à autonomia do paciente, mas também a sua relevância no fortalecimento da relação médico-paciente. Além disso, a transferência de suas vontades para um documento é mais acessível quando a pessoa está sadia do que no momento em que recebe um diagnóstico ruim. Segundo os dados coletados e explanados pelo artigo Testamento Vital: percepção dos pacientes oncológicos e acompanhantes, realizado no Serviço de Oncologia do Hospital Universitário Santa Terezinha (HUST), do Município de Joaçaba, SC, concluiu-se que a aceitação do testamento vital é proporcional ao tempo em que a pessoa está em tratamento, isto é, quanto mais longa a terapia, maior será a aceitação. Ademais, a adesão do testamento vital no Brasil foi amplamente aceita pelos pesquisados, em que apenas um fator se mostrou frágil quanto a essa vontade idiossincrática: a idade. Tal resultado mostrou que a experiência de vida é mister para melhor preparo das respostas do testamento vital, ou seja, os jovens não são muito propensos a responder quando o assunto é doença ou morte. A pesquisa revela, ainda, grande aclamação pela regulamentação jurídica do testamento, a qual “[...] obteve a concordância plena de 90,9% dos pacientes e 94,4% dos acompanhantes, denotando o elevado valor atribuído por ambos os grupos ao testamento vital.” (BONAMIGO et al., 2012).

 

[...] é imperioso que se faça uma campanha de conscientização dos cidadãos brasileiros acerca da importância do respeito à vontade de seus familiares, objetivando evitar conflito entre a vontade manifesta na DAV e a vontade da família. Como esta campanha é um esforço paulatino, entende-se que para tentar amenizar o conflito de vontade de forma imediata será necessário que os médicos conversem com as famílias quando forem informá-las da existência da DAV e que os hospitais mantenham psicólogos e assistentes sociais com esta habilidade. (DADALTO; TUPINAMBÁ; GRECO, 2013).

 

Em suma, as diretivas antecipadas de vontade – devidamente esclarecidas pelas pessoas tanto durante a vida sadia quanto em seu leito de morte – facilitam e norteiam as ações médicas em relação ao tratamento, fundamental para agilizar e para determinar o caminho a ser seguido. Muitas vezes, tal documento diminui os gastos públicos na saúde e poupa esforços aos profissionais quanto ao desgaste físico e mental. A implementação das DAV é, consoante a pesquisa supracitada, bem aceita tanto por profissionais da saúde quanto por usuários e seus familiares, já que respeita não somente a moral do paciente, mas também facilita a decisão médica no tratamento.

Palavras-chave: Diretivas Antecipadas de Vontade. Testamento vital. Respeito à autonomia. Regulamentação jurídica.

 

 [CS1]Embora o prolongamento da vida seja benéfico, percebe-se como contraditório o fato de se manter uma vida que já apresenta sinais de morte, situação que leva o indivíduo por vezes a negar a presença da morte ou sentir-se fracassado diante dela.

 

 [CS2]vida

 

 [CS3]A resolução define as

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Referências

BONAMIGO, Elcio Luiz et al. Testamento vital: percepção de pacientes oncológicos e acompanhantes, Revista Bioethikos, São Paulo, v. 6, n. 6, jul./set., 2012. Disponível em: <http://www.saocamilo-sp.br/pdf/bioethikos/96/1.pdf>. Acesso em 03/05/2016.

CHEHUEN NETO, José Antônio et al.Testamento vital: o que pensam profissionais de saúde?, Revista Bioética, Brasília, v. 123, n. 3, set./dez., 2015. Disponível em:<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-80422015000300572>. Acesso em: 03/07/2016.

NUNES, Maria Inês; ANJOS, Marcio Fabri dos. Diretivas anrecipadas de vontade: benefícios, obstáculos e limites. Revista Bioética, Brasília, v.22, n.2, maio/ago., 2014. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-80422014000200006>. Acesso em: 06/05/2016.

DADALTO, Luciana, TUPINAMBÁM, Unai; GRECO, Dirceu Bartolomeu. Diretivas antecipadas de vontade: um modelo brasileiro. Revista Bioética, Brasília, v.21, n.3, set./dez., 2013. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-80422013000300011>. Acesso em: 07/05/21016.

ROCHA, Andréia Ribeiro da. Declaração prévia da vontade do paciente terminal: reflexão bioética. Revista Bioética, Brasília, v.21, n.1, set./dez., 2013. Disponível em: <http://revistabioetica.cfm.org.br/index.php/revista_bioetica/article/view/790/859>. Acesso em: 08/05/2016.

LINGERFELT, David et al. Terminalidade da vida e diretivas antecipadas de vontade do paciente. Revista UNIFACS, Salvador, 2013. Disponível em:<http://www.revistas.unifacs.br/index.php/redu/article/viewFile/2470/1813>. Acesso em: 09/05/2016.

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Publicado

2016-10-26

Como Citar

Kamijo, E. D., Schweder de Lima, M. V., & Bonamigo, E. L. (2016). CUMPRIMENTO DOS DESEJOS DO PACIENTE POR MEIO DAS DIRETIVAS ANTECIPADAS DE VONTADE. Anais De Medicina. Recuperado de https://periodicos.unoesc.edu.br/anaisdemedicina/article/view/12037

Edição

Seção

Resumos Expandidos